Esgrima

Há pouco mais de um mês realizei um dos meus sonhos de infância: comecei a praticar esgrima. Eu sempre assistia esse esporte nas Olimpíadas e achava interessantíssimo, sempre gostei de armas brancas e quis saber como manejar uma espada, mas esse é um esporte muito caro de se aprender no Brasil e eu, que nao tive acesso sequer a aulas de natação quando criança, nunca tive a mais ínfima esperança de que um dia faria esgrima. 

Eis que recebi um e-mail do clube de funcionários do trabalho dizendo que estavam abertas as inscrições para iniciantes em aulas de esgrima. Fiquei tentada a ser a minha própria sabotadora (a especialidade da casa) e não me inscrever. Muito velha para isso, pensei. Mas ainda estou viva, respondi a mim mesma na minha cabeça. E fui. La, pela primeira vez segurando o florete, ainda me sentia velha para tal coisa, uma tola por estar tentando. Mas, então, comecei a me sentir mais confortável com meu treinador, um senhor na casa dos 70 anos que com muita calma me dizia o que eh o en garde e o touché e como devo me apoiar sobre os joelhos e sustentar a arma. Finalmente, passados os primeiros minutos de vergonha, comecei a me divertir.

E semanalmente estiver frequentando o treino que sempre começa com um aquecimento voltado para testar os seus reflexos e agilidade, como correr na ponta dos pés, correr sobre os calcanhares, atravessar a sala sustentando-se com a guarda alta, roubar uma bola de tênis da sua dupla como se a bola fosse o florete, tocar uma bola de futebol em posição de agachamento ou atacar com a arma contra uma máquina que muda o alvo de lugar constantemente. O instrutor desse momento é enérgico, ele sempre grita coisas como: rápido, mais rápido! Não se esqueça da técnica, vocês são lesmas ou esgrimistas? O seu oponente já teria te acertado! Mas, quando acertamos e ele acha que vamos bem, sorri e nos dá tapinhas nos ombros dizendo que os gritos funcionaram, pois assim despertou a nossa alma de espadachins.

Há muitas crianças e adolescentes treinando conosco. São os filhos de meus colegas de trabalho. São muito melhores que eu, adulta iniciante. E aprendo muito com eles quando treinamos lutando no 1:1. Minha dupla preferida é uma adolescente de quatorze anos com origem espanhola. Ela é uma oponente sempre muito ágil e sorridente, que quando erro diz com toda a paciência do mundo que não é assim e me mostra como devo bloquear o florete se sofrer aquele golpe. Ela é carinhosa em suas correções e quando vê que não consigo fazer algo e me frustro, vem me consolar: não fique triste, você treina a um mês, eu acredito em você. En garde!  A gente vai começar de novo….

Por último, vem o treino com o segundo instrutor, o senhor. Com ele os treinos são menos ágeis e mais filosóficos. Ele avança com a espada me fazendo recuar. Ele vai me guiando como em uma dança em que seus movimentos ditam os meus. E ao longo dessa dança ele me diz as suas filosofias: se você não enxerga o seu oponente, Viviane, o que acontece? – Ele me acerta! – eu respondo. E, então, ele põe o florete contra o meu peito. Sim, ele te acerta. Você me vê, mas ainda não me enxerga. Você sabe a diferença entre as duas coisas? Uma se faz com os olhos e a outra requer todo o seu corpo trabalhando em conjunto com a sua mente.

Esse é o esporte mais interessante que já pratiquei na minha vida e definitivamente vem mudando a minha maneira de pensar. Recentemente, vi em uma página de filosofia publicar uma frase de Sun Tzu que diz: “O ataque é o segredo da defesa e a defesa é o planejamento de um ataque”. Me incomodou ler os comentários e perceber que a maioria das pessoas dizia não ver o mais mero sentido nessa frase. Então, percebi que o esgrima atribuiu a ela um sentido que talvez eu também não pudesse enxergar antes. 

Sun Tzu foi um estrategista militar em um tempo em que as batalhas se davam em lutas com espadas. Sua defesa era de que as espadas deveriam ser utilizadas em último caso, pois a boa estratégia é ser capaz de resolver os dilemas sem o uso de nenhuma arma. É nos exércitos dos tempos de homens como Sun Tzu que baseia-se o esgrima e ouvindo meu treinador e meus colegas de esporte, concordo plenamente que a defesa seja um plano de ataque, pois o seu oponente move-se rapidamente contra você, então é necessário fazer o mesmo. Você percebe que enquanto mantém a guarda alta para se defender, precisa planejar o seu próximo movimento rapidamente e com precisão.

Isso é um aprendizado sábio que se aplica à vida real. Quando em face de uma situação difícil é necessário manter a guarda alta e proteger-se, tomar conta de si para continuar são e planejar o próximo movimento com cautela, mas em tempo hábil. Porém, antes de mais nada, o importante é saber escolher as suas batalhas e ser cortante como a espada apenas em último caso. Estou encantada em como as artes marciais educam não só o corpo, mas principalmente a mente. É para muito além das competições.

Com as etiquetas , ,

1 thoughts on “Esgrima

  1. S. diz:

    Muito bom Vi 👏🏾

Deixe um comentário